CV Joe Lima CV Miguel Rebelo POPUP Fotos da Inauguração
APRESENTAÇÃO
Joe Lima e Miguel Rebelo : a paisagem por inventar
Nascidos com alguns anos de intervalo na ilha de São Miguel e chegados ao Canadá acompanhando as respectivas famílias no mesmo ano de 1969, Joe Lima e Miguel Rebelo encontraram-se pela primeira vez em 2005 num avião rumo à Terceira. Ambos iam participar num acontecimento cultural que teve lugar na galeria onde agora apresentam uma exposição partilhada - ou, se se preferir, duas exposições individuais sobre um tema comum. O avião levantou voo em Montreal, a cidade canadiana onde ambos habitam, Rebelo desde que chegou à América do Norte, Lima só desde 1987. Durante algum tempo, ambos viveram aliás no mesmo bairro, sem saberem da existência um do outro. As circunstâncias fizeram com que Joe Lima se tivesse estabelecido no Canadá inglês, enquanto Miguel Rebelo sempre viveu no francófono Quebeque, ou no Canadá francês, como antes se dizia.
Um fala por conseguinte mais a língua de Molière, o outro mais a de Shakespeare, sendo assim as respectivas formações artística, intelectual e humana ricas de distintas e por vezes divergentes referências culturais. O nomadismo, noção essencial da nossa contemporaneidade, define assim sem dúvida a situação dos dois artistas. Um nomadismo assumido de diferentes maneiras mas que integra naturalmente as respectivas identidades.
Ora quer-me parecer que é a partir desta identidade nómada que os dois pintores olham para as paisagens das ilhas. Paisagens, na realidade, mais rememoradas ou imaginadas do que propriamente observadas.
As telas de Miguel Rebelo, raspadas e laceradas como é hábito, evocam atmosferas nebulosas, aquáticas por vezes mas sempre indeterminadas, onde só raramente se distingue ou se adivinha a linha do horizonte. Turner vem-nos irresistivelmente à memória. Organizadas algumas delas em dípticos ou trípticos, a adjunção aqui e além de um remo de kayak ou da carcaça em plástico de um cisne introduz nestas evocações atlânticas um elemento de instabilidade que remete para outras ambientações, para outras distâncias.
A descoberta relativamente recente das Ilhas constituiu para Joe Lima uma funda revelação, entre outras razões porque elas não correspondiam à imagem fabricada a partir das recordações familiares. Subjugado pelas forças telúricas do local, pelos contrastes entre a doçura e o agreste da natureza, Lima evoca nas suas obras o que o que se vê quando se vai partindo e o que fica quando já se abandonou o arquipélago.
Paisagens nómadas e interiorizadas e por isso essenciais para o estabelecimento de uma nova mitografia plástica das Ilhas, esta exposição podia-se então chamar Ilôts et illusions ou Islets and illusions, um título que talvez respondesse melhor ao propósito dos seus autores. Mas com mais propriedade chama-se ela Ilhéus e ilusões, e assim fica bem, pois o vocábulo português ilhéus tem um significado duplo ausente nas outras línguas : ele significa ao mesmo tempo pequenas ilhas e também os habitantes delas.
Por decisão programática, os Ilhéus de Lima e de Rebelo não têm habitantes, como não os tinham as primeiras verdadeiras paisagens ocidentais (de Albrecht Altdorfer, por exemplo). Mas sem habitantes não existe a paisagem, estejam eles dentro ou fora do campo de visão, no quadro ou fora dele...
Resultado de um encontro fortuito mas não imprevisível entre duas fortes personalidades artísticas, estou em crer que esta exposição marca um momento importante na reflexão contemporânea sobre a prática do género paisagem.
Luís de Moura Sobral
OBRAS EM EXPOSIÇÃO






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